sábado, 18 de agosto de 2012

A LEI MARIA DA PENHA E SUA BANALIZAÇÃO PELA TV GLOBO NA MINE SÉRIE GABRIELA JOGA POR TERRA TODA UMA LUTA DAS MULHERES FEMINISTAS ...

 Sábado, 18 de Agosto de 2012 | ISSN 1519-7670 - Ano 16 - nº 707
CADERNO DA CIDADANIA
LEI MARIA DA PENHA
Lembranças amargas em Gabriela
Por Washington Araújo em 14/08/2012 na edição 707


Neste velho mundo que se reinventa a cada instante nada se faz sem antes sondar fatos, pesquisar, ligar ideias, conectar percepções, percorrer o calendário em todas as possíveis variáveis. A reinvenção é a forma que encontramos para conviver com a realidade de forma a menos indolor possível. E é o movimento natural que aponta sempre para o que está-por-vir, para o que transita entre o hoje e o amanhã. É o mesmo velho mundo que vai dormir em meio aos ataques totalitários do governo Bashar al-Assad contra a população civil de Aleppo, contingente populacional indefeso e transformado em alvo militar estratégico e que vai acordar em meio às notícias das medalhas olímpicas que ganhamos ou deixamos de ganhar em Londres.

A vida que passa nos meios noticiosos é a vida de todos nós: grandes mesquinharias, pequenas glórias, exacerbado individualismo para manter o bem-estar da parte e porções ínfimas de solidariedade para com o sofrimento do todo.

Enchemos os olhos com as desoladoras imagens dos indignados espanhóis marchando sobre Barcelona e Madri, Alicante, Valencia e Zaragoza e vociferando palavras de ordem contra medidas governamentais que nada mais fazem do que manter o desemprego do povo espanhol em insuportáveis 24,7% da massa de trabalho economicamente ativa.

Assistimos ao intervalo comercial na telinha mágica, sempre anunciando a liquidação das liquidações de veículos, a mãe de todas as queimas de estoques e três ou quatro instituições bancárias afirmando, cada uma, ser a pioneira na baixa expressiva dos juros para empréstimos e manutenção do cheque especial. São comerciais que falseiam tanto a verdade que usam e abusam de aumentar os preços artificialmente em uma hora para, na meia hora seguinte, oferecer imperdível descontos de tantos por cento. E fazem isso com tanta naturalidade que somos tentados a compreender que o mundo é bem mais virtual que real, é mais corrida de obstáculos para conseguir vantagens que meros 100 metros rasos a serem percorridos sem qualquer cronometragem.

Pensamento arcaico

Refeitos dos clipes publicitários, reingressamos na atmosfera cada vez menos diferenciada dos clipes noticiosos. As imagens se embaralham, formam belos desenhos, emolduram rostos com boa dicção e arremessam fiapos de notícias – muitas desencontradas, outras pela metade, a maioria condenada ao esquecimento instantâneo de nossas mentes agitadas pelos jogos de luzes, pelos graves e agudos ainda ecoando dos intervalos comerciais.

Entramos no reino da teledramaturgia com a mesma naturalidade com que juízes do Supremo Tribunal Federal se concedem o direito de cochilar e, de tanto ouvir o clamor dos advogados dos réus da Ação Penal 470, sentem-se embalados a deixar o sono os dominar, correr solto. Vez ou outra um advogado faz referência aos personagens da novela da 9 de maior audiência da atualidade – Avenida Brasil (TV Globo) –, Carminha, Rita, Max. Folhetim idealizado para transformar atos de vingança em atos de justiça explícita, trama copiada do seriado Revenge recentemente produzido nos Estados Unidos.

Mas a noite de terça-feira, 7 de agosto, marcou o grande descompasso entre cidadania e a dramaturgia, cidadania e novela, cidadania e TV Globo. Refiro-me à novela Gabriela, adaptada do romance Gabriela, cravo e canela do genial Jorge Amado, que reúne a chamada prata da casa – Antonio Fagundes, Maitê Proença, José Wilker, Laura Cardoso, Ari Fontoura, Juliana Paes, Mateus Solano, Humberto Martins etc – e investe pesado na recriação de Ilhéus nas primeiras décadas do século 20. Trata-se de esmerada superprodução de TV Globo: fotografia deslumbrante e caracterizações algo como a meio passo da perfeição. A recriação do Bataclan, abrigo das prostitutas da região, verdadeiro Moulin Rouge encravado na geografia baiana, é um capítulo à parte com seu clima de clube de mafiosos tão onipresente na Chicago de 1920.

Mas se a história é saborosa, o elenco impecável – conta até com uma antológica Ivete Sangalo no papel da cafetina Maria Machadão –, a música interpretada por uma faceira Gal Costa é do nosso maestro soberano Tom Jobim, as imagens em tudo se aproximam da qualidade cinematográfica... Então, qual o problema? Qual o descompasso? Qual a razão da implicância?

É que exatamente em 7 de agosto a Lei Maria da Penha (Lei nº 11.340) celebrou seu sexto aniversário de vigência. É resultado direto da luta das mulheres brasileiras e do avanço legislativo internacional no enfrentamento da violência doméstica contra a mulher. Não é extemporâneo recordar que a lei é considerada uma das mais avançadas do mundo e principal instrumento para mulheres se defenderem de seus agressores. E o que isso tem a ver com a superprodução da Vênus Platinada?

O capítulo de Gabriela de 7 de agosto foi quase que inteiramente dedicado à performance do Coronel Jesuino (José Wilker) para lavar com sangue a sua honra: mata a tiros e à queima roupa sua esposa Dona Sinhazinha (Maitê Proença) na cama com seu amante, o dentista Dr. Osmundo (Erik Marmo), que teve o mesmo fim. O capítulo é pródigo em mostrar as mais variadas moções de solidariedade a Jesuíno. E elas vêm dos coronéis, chefes políticos, advogados, políticos, latifundiários, damas da sociedade. Todos concordam entusiasticamente com o ato do assassino confesso.

Em um país onde a violência contra a mulher vem de muito longe, talvez trazida ainda nas caravelas de Cabral, nos idos de 1500, foi no mínimo irônico e de profundo mau gosto comemorar uma infante lei – em vigor há seis anos apenas – trazendo a lume muito do pensamento arcaico, sectário e violento que insiste em sobreviver em nosso inconsciente coletivo, revivendo-o em cenas e falas dos ícones maiores de nossa teledramaturgia.

Curiosamente, poucas horas antes de o capítulo ser exibido, estiveram em solenidade no Senado Federal para comemorar o aniversário da Lei Maria da Penha os atores da TV Globo Malvino Salvador e Oscar Magrini. No fundo, talvez pensassem estar celebrando o sexto aniversário da promulgação de uma hipotética lei... Sinhazinha da Penha.

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[Washington Araújo é jornalista e escritor; mantém o blog http://www.cidadaodomundo.org/ ]

LEI 11.652/2008 que criou a EBC - EMPRESA BRASIL COMUNICAÇÃO

FORTALECER O CONSELHO CURADOR DA EBC

A Lei 11.652/2008, que criou a EBC – Empresa Brasil de Comunicação - significou um avanço decisivo na política de fortalecimento da Comunicação Pública em nosso país. Como um marco legal bastante avançado para o setor, esta Lei apresenta princípios gerais e competências para a EBC, que a circunscrevem como a espinha dorsal na construção do sistema público de comunicação do país. Além disso, a Lei em questão garante algumas ferramentas importantes de participação social, como o Conselho Curador e a Ouvidoria. No caso do Conselho Curador, ele é composto de 15 membros representantes da sociedade civil, 4 do Poder Executivo, 2 do Poder Legislativo e 1 representante dos Funcionários. Em que pesem nossas divergências sobre a forma como se dá o processo de escolha dos representantes da sociedade civil – com dois mecanismos de filtro não previstos em lei -, entendemos ser muito importante participar ativamente desse processo, como prerrequisito para o fortalecimento da EBC e de sua missão institucional.



Em 19 de julho recente foi publicada no DOU o Edital de Consulta Pública n. 03/2012, convocando as entidades da sociedade civil para a indicação de nomes para ocuparem 2 vagas da sociedade civil, recentemente abertas do Conselho Curador, para um mandato de 4 anos, renovável por uma única vez. O prazo para que estas indicações sejam feitas vai até 28 de agosto. Cada entidade que quiser se inscrever na Consulta Pública poderá indicar 2 candidatos, através de formulário próprio e de documentação mínima exigida (ver em www.conselhocurador.ebc.com.br/consultas-publicas . Estas entidades precisam ser constituídas como pessoas jurídicas de direito privado, e ter existência legal de, no mínimo, um ano até a data de publicação do Edital (19/07/2012). O Edital sinaliza que, para o preenchimento dessas 2 vagas em questão serão observados alguns critérios especiais, a saber: a necessidade de ampliação da diversidade regional especialmente no que diz respeito às regiões Norte e Centro-Oeste, e da presença de mulheres, dos indígenas e negros, bem como conhecimento e atuação em áreas de comunicação pública, direitos humanos e rádio. Uma lista geral de indicações será construída, a partir das diversas indicações das entidades, e o Conselho Curador irá compor uma lista de até 8 nomes a ser indicada para escolha final da Presidente da República.



O FNDC – Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação avalia que seria muito importante que as entidades nacionais envolvidas com a luta pelo direito à comunicação e pela liberdade de expressão participem ativamente deste processo, analisando a possibilidade de indicações de nomes vinculados à nossa luta. Também consideramos importante traçarmos uma estratégia conjunta para nossa participação neste processo. Esta estratégia passaria por garantir um grande número de entidades participando do processo de indicação – isto ajuda a legitimar o processo como um todo; buscar construir unidade na indicação de nomes, sempre respeitando a autonomia de cada organização, para evitar a fragmentação e aumentar a chance de escolha de pessoas com compromisso com a democratização da comunicação.



Uma proposta possível, neste sentido, é o de construir entre nós uma lista máxima de 8 nomes, já que o Conselho Curador irá selecionar 8 nomes entre todos os indicados para encaminhar à escolha final da Presidência da República. Num segundo momento, podemos avaliar a necessidade de priorizar 2 nomes, com vistas a fortalecer uma estratégia de consolidação destes 2 entre aqueles a serem escolhidos pela Presidente da República. Como o prazo final para as entidades fazerem as suas indicações é 28 de agosto, nossa sugestão é que o conjunto de entidades se posicionem sobre o interesse em participar e se tem nomes a indicar até o dia 15 de agosto. Entendemos que uma estratégia comum poderá fortalecer as indicações de nomes ligados à nossa luta.



Além da indicação de nomes, também seria interessante pensarmos numa pequena plataforma de compromissos mínimos que as candidaturas oriundas desta articulação irão assumir para a sua atuação no Conselho Curador, que passa pelo aprofundamento da interlocução com a sociedade civil organizada, pela defesa de uma maior democratização do processo de escolha de novos Conselheiros, e pelo fortalecimento do Conselho Curador como ferramenta de participação social na política de Comunicação Pública.



Coordenação Executiva do FNDC