domingo, 19 de julho de 2009

SUBSECRETÁRIO

Por uma herança maior que o artista
Jornalista Luiz Carlos Sousa - Fonte: http://www.portalcorreio.com.br/jornalcorreio/matLer.asp?newsId=91022

A Cultura paraibana se prepara para viver um momento de resgate e incentivo, com projetos de preservação, recuperação, capacitação profissional, oficinas de artes e construções de museus. Um detalhe chama a atenção: a interiorização e a diversificação de público. A criação e os recursos agora não serão destinados apenas aos megaeventos. Irão para escolas e para as cidades, numa troca constante de informações com o objetivo de legar uma herança artística às futuras gerações. O subsecretário de Cultura Flávio Tavares diz que quer deixar como herança algo maior do que o egoísmo do artista ao comentar a energia que está dirigindo às ações, apesar de ter a consciência de que “o tempo é um grande vilão”. Os desafios e as dificuldades são encarados por ele como missão quando se vê diante de projetos como O Museu da Cidade, o Memorial Sivuca, o Itinerarte, o Museu de Arte Moderna, o Espaço Cultural e bibliotecas. Flávio não está conseguindo pintar, mas recorre ao o desenho, como caligrafia e onde “plasmas idéias”. Em seu gabinete, ele recebeu o Correio e fez uma revelação: quando foi convidado para o cargo “o susto foi grande”, mas descobriu que a criatividade do artista não está só nos pincéis e que anunciar um projeto como um museu “é como dizer que terminei um grande painel”.

A entrevista


- Qual a avaliação que o senhor faz desses quase 150 dias à frente da Cultura?

- Os projetos estão em ritmo acelerado. Eles estão ligados, por exemplo, aos Caminhos do Frio, às oficinas de arte. Estamos tentando instalar uma representação da secretaria na Funesc para cuidar dessas oficinas, dentro de um projeto que estamos chamando de Labirinto das Artes.

- Que outros projetos o senhor destacaria?

- O de Taperoá, elaborado por Valquíria Farias e Alice Monteiro junto com a prefeitura do município e o Governo do Estado, com a ajuda do Ministério da Integração, que vai incluir teatro e dar sustentabilidade também às escolas. Mas a maior vitória da secretaria é o já aprovado Museu da Cidade, projeto magnífico de Ana Helena Curti e Pedro Mendes da Rocha, autores da Casa da Língua Portuguesa em São Paulo. A pesquisa histórica foi feita pela equipe da professora Rosa Godoy com aprovação do governador José Maranhão.

- Por que o museu é considerado a maior vitória?

- Porque ele terá uma conotação não só de contar a História da Paraíba de forma virtual e material, mas também estará interligado ao sistema escolar. É importante também porque esse museu faz parte de um resgate do governo Maranhão de uma obra parada há mais de cinco anos. E outro sonho que vamos concretizar, não só meu, mas de toda a Paraíba, é o Memorial Sivuca, que é uma grande homenagem ao genial artista da nossa querida Itabaiana.

- O projeto do Memorial Sivuca tem alguma parceria?

- Contamos com o apoio do ministro da Cultura, Juca Ferreira, e com a Universidade Federal da Paraíba, onde já existe a sala Sivuca. A Universidade já deu os primeiros passos junto com Glorinha Gadelha e o maestro Carlos Anísio, editando as partituras de Sivuca. Esse memorial pertencerá não só ao Estado, mas ao povo da Paraíba.

- Como será o projeto Itinerarte?

- Essa é em parceria com a Secretaria de Comunicação, através da jornalista Lena Guimarães, A União e a Secretaria de Educação. As cidades vão ter uma confluência e diversidade de culturas entre elas. Vamos levar artistas de uma cidade para outra com oficinas ligadas ao teatro, música, artesanato e artes plásticas, percorrendo todo o Estado.

- Algum projeto de resgate da memória artística e cultural de forma mais abrangente?

- Estamos fazendo um levantamento da memória das culturas de raízes, que eu chamo de heranças culturais, que a gente não pode esquecer. Desde Altimar Pimentel, para dar seguimento aos cocos de praia e à nau catarineta. E há um grande projeto para as cidades onde há raízes muito fortes e autênticas dos caboclinhos e maracatus, entre outros folguedos.

- E para o Espaço Cultural?

- Estou junto com Maurício Burity nessa jornada para fazer justiça ao nome Espaço Cultural. Faremos reformas no teatro e pediremos recursos ao Ministério da Cultura para reativar o cinema e realizar oficinas. A lutheria já está funcionando e a biblioteca Juarez da Gama Batista está sendo restaurada, inclusive a infantil, que está em péssimo estado, merece toda atenção.

- O Espaço Cultural realmente perdeu parte de sua finalidade?

- Aos poucos vamos tirar esse estigma do Espaço Cultural, de que foi dado a ele um tratamento indevido. E faltou muito respeito também à memória de um homem que era apaixonado pela cultura, que foi o ex-governador Tarcísio Burity.

- Há algum projeto para ampliar o espectro do Espaço Cultural?

- Existe o projeto feito no primeiro governo Maranhão sobre a fundação do Museu de Arte Moderna, que será uma das pautas da reunião no próximo dia 5 com o ministro da Cultura, e o levantamento da memória do Estado, não só das artes plásticas, mas a função da permanência do artista dentro da escola.

- O que o senhor quer dizer exatamente com a permanência do artista na escola?

- A gente tem talentos excepcionais. Basta lembrar de Mike Deodato, que é um gênio da história em quadrinhos, herança de seu pai. Um gênio isolado, trabalha só, mas essa semente dele germinou. Hoje em dia continua existindo muita gente de talento. E na parte de música, um levantamento dos grandes grupos que a Paraíba, junto com a herança de um Jackson do Pandeiro, por exemplo. Eu tenho consciência do tempo como vilão, mas existe uma vontade enorme do governador Maranhão em agilizar e o professor Sales Gaudêncio tem contribuído de forma magnífica para agilizar esses pontos que ficaram pendentes.

- Que pontos são esses?

- Um deles é a Lei Augusto dos Anjos, o FIC, que enfrenta um problema gravíssimo que é a herança de uma dívida de R$ 1,2 milhão. A gestão anterior usou quase R$ 500 mil do ano passado para o ano retrasado para fechar as contas de dois anos atrás. E deixou a herança. Temos agora projetos importantíssimos, como o de Marcélia Cartaxo e de grandes artistas ligados às nossas raízes, com projetos aprovados, sem a gente saber como pagar. Agora, se você pegar os impostos das empresas, o investimento será para o próximo ano, perante os cânones jurídicos. Estamos apelando para o governador, que já deu o sinal de que vai tentar resolver este assunto o mais rápido possível. Mas é uma herança das piores para a cultura paraibana.

- O teatro Santa Roza e a Biblioteca Pública têm algum programa especial?

- O teatro Santa Roza está sendo restaurado, e a Biblioteca Pública, da qual Gonzaga Rodrigues falou com toda razão, a gente está resolvendo como agilizar. Por coincidência, a pauta do Conselho de Cultura nesta segunda é exatamente esta. Estamos ouvindo as inteligências paraibanas.

- Os projetos existem, o problema é a falta de recursos?

- Vou ter uma audiência com o ministro Juca Ferreira, da Cultura, sobre determinados problemas que o Estado não tem como resolver.

- Como a secretaria vê o Festival de Inverno de Campina Grande?

- É um festival importantíssimo. Temos a maior atenção a Campina Grande, porque é o centro maior da diversidade cultural, e a Eneida Agra. Indiscutivelmente o maior evento é o São João e com o São João está agrupando princípios de outras culturas, como o artesanato. O mundo e o Brasil têm olhado para Campina Grande como um emblema da cultura de uma terra que se chama Paraíba.

- Que projeto específico há para Campina Grande?

- Estamos equacionando e estudando vários projetos de arte para o Agreste, onde Campina indiscutivelmente será o centro. Campina sempre esteve na vanguarda. O museu de arte foi e será sempre uma referência das maiores do Estado e neste novo projeto temos ainda que ver com a UEPb como equacionar o problema dos quadros, uma vez que alguns precisam de restauração. E já que falamos em restauração, em João Pessoa, no Espaço Cultural, também há telas que estão em estado lastimável, não só de paraibanos, como de estrangeiros. O presidente da Funesc, Maurício Burity, pediu uma consultoria minha no levantamento das obras e no restauro.

- Como o senhor identifica os propósitos dos governos Lula e Maranhão para a Cultura?

- Com os olhos abertos para ao futuro, porque esses frutos vão ser plantados para daí a algum tempo a gente ter uma consciência maior do que se chama herança cultural, herança histórica. A gente vai ver junto com alunos e artistas um desenvolvimento mais perene da cultura.

- Algum encontro previsto com representantes dos municípios para traçar metas e definir objetivos?

- No começo de agosto haverá um fórum, junto com o MinC, com secretários municipais para a gente ver como as necessidades poderão ser resolvidas. Será discutida toda a diversidade cultural através do seu secretário Américo Córdula e um dos grandes projetos do Governo Federal a ser implantado se chama Vidas Paralelas, que dará sustentabilidade a várias comunidades esquecidas ao longo dos tempos.

- Inclusão e capacitação?

- Claro e, como já falei, sustentabili dade. Evidente que a gente sabe que isso tem um tempo para ser concretizado, mas temos que começar, senão fica só na conversa.O problema é que houve um atraso enorme em determinados momentos da cultura brasileira, que acredito foi causado pelo excesso de centralização em estado ricos, como São Paulo, Rio, Minas, Bahia e Pernambuco.

- A política de cultura está centralizada na secretaria?

- Está. Tem que haver mais discussões para que no futuro a subsecretaria se transforme em Secretaria de Cultura e a resposta a essa pergunta seria mais plena. Mas este possivelmente será um debate entre o governador José Maranhão, a Secretaria de Educação e Cultura e a Assembléia Legislativa.

- A cultura é algo tão diverso. Será possível concentrar todas as políticas numa única secretaria?

- A secretaria tem que existir como secretaria e não como subscretaria. Só a Paraíba e Sergipe têm esse modelo de subsecretaria.

- Como é a relação com o secretário de Educação?

- Até agora, eu só tenho que agradecer de forma veemente ao professor Sales. Nenhum dos pedidos que fizemos foi negado. O Intercâmbio de entendimento é contínuo. A gente está junto numa batalha enorme.

- Como um artista que trabalhou a vida inteira só, dependendo exclusivamente de seu talento e de sua sensibilidade, se vê hoje pensando políticas públicas para a área de cultura, gerindo recursos e lidando com as circunstâncias do poder?

- É uma pergunta muito boa e difícil. É quase psicanalítica. Eu devia estar num divã. Eu pensava que o mundo se resumia entre os olhos e a tela e que os problemas eram de estética: estrutura, cor, contraste, equilíbrio. Acredito que o músico também tem isso: melodia, harmonia. O susto foi grande e continua sendo grande. Eu pensava que na cabeça do ser humano existiam princípios divisórios. Você cria, é artista e você vai coordenar uma secretaria. Há um engano muito grande. O princípio criativo é único, não tem essa divisão.

-Você tem conseguido pintar?

- Não. Desenhar eu não deixo, porque é minha caligrafia, onde plasmo as idéias. Mas pintar não consigo, porque a pintura pede que você fique no ateliê bastante tempo, por causa das ligas de tinta, existe um comando da química pra você. E você não pode ser leviano, deixando o ateliê e voltando depois. Mas o desenho supre muito bem esse lado.

- Como um artista que expõe seu talento à crítica e ao público se sente num cargo público, tendo que atender demandas e lidar com a política?

- Eu passei a vida inteira jogando pedra na vitrine, querendo museu, querendo isso e aquilo, reclamando que não tem biblioteca, que não tem entendimento de arte, que o artesão está se perdendo, vendo que a vida tem uma necessidade de se transmitir uma herança de cultura. Essa energia criadora está sendo dirigida para os outros dentro do princípio de que os outros também sou eu.Tenho necessidade de deixar como herança algo maior do que o egoísmo do artista.

- Como foi o entendimento com o governador?

- Ao me convidar, ele disse: Flávio, você pode fazer muito, não só pelas artes plásticas, mas pelo seu entendimento de cultura em geral. É uma oportunidade que tenho de deixar como legado alguma herança que possa favorecer as gerações futuras. Recebi esse convite com muita honra e tenho encarado isto, desde o começo, como uma missão. Não messiânica, que seria muito pretensioso, mas uma consciência plena de que posso fazer algo pela cultura. E esse algo não é pintura, desenho, mas um levantamento do entendimento da cultura.

- E como você lida, por exemplo, com as dificuldades burocráticas?

- Realmente tenho tido, mas nisso o professor Sales e a minha equipe têm me ajudado muito.

- E a angústia criativa do artista como fica?

- Essa criatividade não está só no pincel. Ela faz parte do ser humano. Na hora em que eu digo que o museu vai sair é como dizer que terminei um grande painel. Essa energia é gratificante. É um aplauso. Um exemplo foi Gilberto Gil. Ele deu sua força criativa para um projeto de cultura, viu que o Brasil precisava dele. Meu pai, Arnaldo Tavares, foi assim. Além de médico, lutou muito por várias vertentes de cultura no nosso Estado. Sinto que a marca da cultura não é a marca de assinar uma tela. O artista não vai se tornar eterno com a assinatura. O artista passou a assinar de 1300 para cá. A arte sempre pertenceu ao povo. Quando você fala da cultura egípcia, ou da grega, ou da asteca, tupi, você não se lembra de nenhum artista. Você se lembra de uma cultura artística, cultura de um povo.

MARCHINHA

Marchinha pra seu Gilmar


Pela ordem, seu ministro
Explique essa decisão
Derrubar o meu diploma
É liberdade de expressão?

Estudei por quatro anos
Ralando que nem CDF
Pra ver meu diploma jogado
No lixo pelo STF

O senhor até falou
Explicando a decisão
Que jornalista e cozinheiro
Não dá risco pra nação

Oh, seu Gilmar, oh seu Gilmar
Você tirou o meu diploma
E eu não sei nem cozinhar

Culinária? Não entendo
Não faço nem ovo frito
Se soubesse, com certeza
Fritaria os do ministro.

Mas agora não tem jeito
Serei cozinheiro autônomo
Mas vou logo lhe dizendo
Seu Gilmar, se eu cozinho eu como

Oh, seu Gilmar, oh seu Gilmar
Você tirou o meu diploma
E eu não sei nem cozinhar

Carlos Nealdo