Democratizar a comunicação é avançar na cidadania
Nesse sábado último 28 de maio, o Forúm de Mídia Paraibano esteve reunido mais uma vez para tratar de propóstas pós I CONFECOM ,o que não quer calar para nós agentes culturais e movimentos sociais representantes do povo e sociedade civil em geral, é que passados tanto tempó, e das 700 propostas prioritárias aprovadas na I CONFECOM, NADA AINDA FOI FEITO PARA A DEMOCRATIZAÇÃO DA COMUNICAÇÃO, REGULAMENTAÇÃO E conselho de comunicação aqui na Paraíba.
Para começar bem a semana ,temos a entrevista da jornalista e professora da Unicap Universidade Católica de Pernambuco, Ana Veloso concedeu a Bia Barbosa, do Intervozes, para a Agência Patrícia Galvão.
À entrevista, pois:
‘É urgente que o poder sobre os meios de comunicação seja democratizado’
Sex, 27 de Maio
(Agência Patrícia Galvão) Ultrapassada e pouco democrática, a legislação que hoje rege o setor das comunicações tem se mostrado um entrave não apenas para o desenvolvimento da própria mídia no país como também um obstáculo considerável para a consolidação da democracia brasileira. Em 2009, mais de 30 mil pessoas participaram da I Conferência Nacional de Comunicação (Confecom), que teve entre suas principais resoluções a necessidade da construção de um novo marco regulatório para o país. A tarefa está a cargo do Ministério das Comunicações, comandado por Paulo Bernardo, que no início de seu mandato afirmou que esta seria uma de suas prioridades.
Ao final do governo Lula, um anteprojeto de lei, coordenado pelo então ministro da Secretaria de Comunicação da Presidência da República, Franklin Martins, foi encaminhado à equipe da presidenta eleita Dilma Rousseff. Até agora o texto não foi tornado público. Organizações da sociedade civil e movimentos sociais têm cobrado do governo a abertura do debate com a população.
Na última semana, no seminário “Marco Regulatório: propostas para uma comunicação democrática”, organizado pelo Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC) no Rio de Janeiro, dezenas de entidades afirmaram que esta deve ser a principal tarefa posta para o Ministério das Comunicações, juntamente com políticas que garantam a universalização do acesso à banda larga. “Este novo marco regulatório deve abranger todo o setor de comunicações, dando conta do processo de convergência e estabelecendo regras que afirmem a liberdade de expressão e o direito à comunicação de toda a população, buscando garantir a pluralidade e a diversidade informativa e cultural”, disseram em nota.
Nesta entrevista, a jornalista Ana Veloso, professora da Universidade Católica de Pernambuco, colaboradora do Centro das Mulheres do Cabo (PE) e representante da sociedade civil no Conselho Curador da EBC (Empresa Brasil de Comunicação), levanta os principais pontos que um novo marco regulatório deveria tratar. E fala da importância desta pauta para a conquista dos direitos das mulheres.
Por Bia Barbosa
1 – Desde a I Conferência Nacional de Comunicação, cresceu na sociedade brasileira a demanda por um novo marco regulatório nas comunicações. Por que, na sua avalição, esta pauta se mostra urgente?
Ana Veloso - A pauta é urgente, uma vez que a sociedade brasileira espera que o poder sobre os meios de comunicação possa ser compartilhado, democratizado. É urgente para que outras vozes possam circular nos meios de comunicação no país. A sociedade brasileira demonstrou, na I Confecom, que quer participar do processo. É absolutamente contraditória, em um país que quer ser democrático, a permanência de poucas famílias no controle da produção e distribuição de conteúdos na mídia privada. Está ficando cada vez mais insustentável, politicamente e socialmente, que poucos senhores continuem ditando as regras do que pode ou não ser pautado na esfera pública do rádio e da televisão. Poderíamos começar regulamentando os artigos que tratam da comunicação na Constituição de 1988. É escandalosa a relação entre muitos parlamentares e as concessões de rádio e televisão no Brasil. A regulação dos meios de comunicação no Brasil poderá, inclusive, evitar que alguns programas e veículos, imersos em uma situação de quase absoluta falta de regras, utilizem o argumento do exercício da liberdade de expressão para violar os direitos humanos das mulheres.
2 – Que pontos centrais precisariam ser mudados no novo marco?
Ana Veloso - Considero que o novo marco deve ser incisivo com relação a algumas questões:
1) Programas/veículos/emissoras que violem direitos humanos devem ser imediatamente retirados do ar e as emissoras precisam sofrer penalidades, como aconteceu com as violações praticadas pelo programa Tarde Quente (RedeTV!), do apresentador João Kleber, que resultou no caso “Direitos de Resposta”;
2) As regras para as concessões não devem privilegiar os critérios econômicos, como estudos comprovam. A definição dos critérios para obtenção de uma outorga deve ser feita em grupos de trabalho, com representantes escolhidos/eleitos/indicados pela sociedade, veículos e Estado, refletindo a diversidade da sociedade brasileira;
3) Toda renovação das concessões deve passar por uma análise de como aquela emissora prestou o serviço de radiodifusão naquele período; esta análise deve ser feita pelo Estado e ouvir também representantes escolhidos/eleitos/indicados pela sociedade brasileira;
4) Regulamentar o direito de resposta, que foi desregulado com a queda da Lei de Imprensa;
5) A questão da publicidade também é um ponto central: a legislação afirma que só podemos ter 25% do tempo da grade de programação ocupado por propaganda, mas estudos comprovam que o percentual veiculado é bem maior;
6) Outra questão que tem que ser enfrentada é a sublocação da grade de programação para veiculação de programas religiosos, um dos problemas mais graves da ausência de uma regulação consistente no setor;
7) O papel dos órgãos fiscalizadores deve ser revisto, uma vez que a Anatel, por exemplo, demonstra alto rigor com as rádios comunitárias enquanto as emissoras comerciais desrespeitam impunemente a legislação;
8) O marco legal deve indicar ainda formas de financiamento para as mídias comunitárias, educativas e públicas, como fundos públicos constituídos com percentuais dos altos lucros e/ou impostos que as empresas privadas deveriam recolher;
9) Por fim, é preciso regulamentar o Artigo 221 da Constituição e garantir a veiculação de produção independente e regional na TV, com a implementação do percentual de 40% de programação regional nas emissoras, como propõe o projeto da deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ), há cerca de 20 anos em tramitação no Congresso Nacional.
3 – Como conselheira da EBC, você acredita que as emissoras públicas de rádio e televisão também precisam de uma nova regulamentação para se fortalecerem?
Ana Veloso - Considero que sim. Não sei se haveria possibilidade de uma uniformização na legislação, uma vez que as emissoras estaduais têm ordenamento próprio. Todavia, é preciso uma revisão no marco das emissoras públicas para que a sociedade possa participar muito mais da definição de sua programação e de suas decisões em geral, como acontece agora com o Conselho Curador da EBC. A revisão do marco regulatório no setor público também poderá dotar essas emissoras de maior autonomia político-financeira em relação aos governos. Além disso, poderia indicar mais alternativas de financiamento público para as mesmas, e regras explícitas para que sua sustentabilidade não estivesse sob constante ameaça.
4 – Como um novo marco regulatório das comunicações poderia contribuir para o avanço da luta das mulheres?
Ana Veloso - No Brasil, assim como em outros países, as mulheres ainda são tratadas prioritariamente de duas formas pela mídia: ou como consumidoras, ou como objeto sexual. Precisamos ter elementos palpáveis e instrumentos legais para enfrentar questões como a mercantilização de nossos corpos e a reprodução de estereótipos, que nos colocam em situação de submissão e desvantagem, veiculados diariamente nos meios de comunicação de massa. A regulação poderá oferecer, para o movimento de mulheres, as ferramentas necessárias ao exercício da análise e da crítica da mídia com a efetiva ação no sentido de garantir que os meios de comunicação não permaneçam reeditando preconceitos e o sexismo. Também poderá ser importante para a limitação do acesso/sublocação do espaço pelas correntes religiosas que, com seu proselitismo, acabam por atentar contra os direitos conquistados pela população feminina e por favorecer a perpetuação dos fundamentalismos. Por fim, as mulheres também necessitam de incentivos para atuar, ainda mais, no campo da produção de conteúdos, de forma que também estejam representadas na mídia em toda a sua diversidade.
5 – Apesar de ser estratégica, regular as comunicações é uma agenda que ainda encontra resistência na maior parte da sociedade, sobretudo nos proprietários dos meios de comunicação. Como superar este obstáculo?
Ana Veloso - Realmente, esta não é uma discussão fácil. É preciso que o Estado brasileiro tenha capacidade de dialogar e de implementar para os concessionários de rádio e TV regras discutidas e aprovadas junto com a sociedade, incluindo o setor empresarial. As propostas aprovadas pela I Confecom devem, inclusive, nortear este processo de regulação dos meios. Trata-se, também, de um investimento, que precisa ser feito, em uma ação educativa junto à população com relação ao problema gigante que precisamos enfrentar no campo da comunicação brasileira. Temos um histórico de privatização de bens públicos. A sociedade desconhece que tem direito à comunicação. Só agora ensaiamos a construção de um sistema público de mídia. Portanto, foram muitos anos de favorecimento a uma elite branca, masculina e heterossexual que comanda hoje este setor. Contudo, principalmente nos últimos dez anos, percebemos que a sociedade está cada vez mais atenta, vigilante e que exige democracia e pluralidade neste espaço.
6 – O ministro Paulo Bernardo anunciou, no início de sua gestão, que o debate sobre o novo marco regulatório estava entre as prioridades do governo Dilma. Agora, o governo parece recuar em colocar o tema em discussão pública. O que o ministro pode temer?
Ana Veloso - Teme ataques da chamada velha mídia. Teme oposição dos grandes veículos de comunicação, como se isso não tivesse ocorrido desde a campanha eleitoral da presidenta Dilma. Compreendo que há um forte receio de que o governo possa ser considerado contrário à liberdade de imprensa, como ocorreu quando vários países na América Latina implementaram regras mais duras para evitar a concentração da propriedade dos meios, os monopólios e os privilégios das empresas privadas do setor. Todavia, o que o governo brasileiro, que quer manter sua imagem de democrático perante o mundo, parece não enxergar é que o desequilíbrio entre os sistemas público, privado e estatal de comunicação e a histórica primazia do empresariado no setor limitam as possibilidades do exercício da democracia para o conjunto da população brasileira. A privatização da produção dos bens simbólicos e a prevalência de interesses particulares em detrimento do interesse público podem se configurar como um dos maiores ataques à democracia em nosso país.
Apesar desta limitação, em vários momentos, a presidenta Dilma foi enfática na defesa da pluralidade no setor e no respeito à liberdade de expressão e de imprensa. A quebra de um ciclo histórico de ministros ligados à mídia ocupando a pasta das Comunicações também pode ser considerado um avanço. Mas um dos problemas para o governo é a alta articulação entre políticos e empresas de comunicação. Temos cerca de 30% dos parlamentares do Congresso Nacional com negócios na área. O governo precisa se fortalecer junto à sociedade civil e ter habilidade em construir propostas consistentes que possam responder às questões levantadas pela I Confecom.
Contato com a entrevistada
Ana Veloso – jornalista e professora da Universidade Católica de Pernambuco
Centro das Mulheres do Cabo
Representante da sociedade civil no Conselho Curador da Empresa Brasil de Comunicação (EBC)
Cabo de Santo Agostinho/PE
(81) 9965-5064 / 3524-9170 / 3521-9366
velosoanam@gmail.com / anaveloso@mulheresdocabo.org.br
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