quarta-feira, 27 de janeiro de 2010

ROUANET

Lei Rouanet sai da gaveta e enfrenta o Congresso

Texto prevê que o governo nunca destine menos do que 40% ao Fundo Nacional de Cultura (FNC)

Jotabê Medeiros

Pinacoteca do Estado pediu R$ 13 milhões para renúncia fiscal em 2009, mas reforma da lei veta novo pedido. Foto: Paulo Pinto/AE


SÃO PAULO - É uma mudança radical na filosofia de incentivo à cultura no País. A nova Lei Rouanet, cujo texto foi assinado na terça, 26, pelo presidente Lula, prevê que o Fundo Nacional de Cultura (FNC) nunca poderá ter menos do que 40% do orçamento do MinC. Até hoje, o fundo (que permite o incentivo direto, sem que o produtor precise captar dinheiro no mercado) recebe valores irrisórios e aleatórios. A maior parte dos recursos chega via renúncia fiscal - empresas adiantam o dinheiro aos produtores culturais, e depois são reembolsadas na hora de declarar o seu Imposto de Renda (IR).

Foram criados nove fundos setoriais - Artes Visuais, Artes Cênicas, Música, Acesso e Diversidade, Patrimônio e Memória, Ações Transversais e Equalização, Audiovisual, Inovação do Audiovisual (o que compreende curtas-metragens, médias-metragens e experimentalismo) e Livro, Leitura, Literatura e Humanidades (cuja divisão, para separar literatura do mercado, será definida em lei específica). Desses nove fundos, sete terão entre 10% a 30% do total dos recursos - o restante irá para o audiovisual, segundo o texto, que ainda deverá passar pela aprovação da Câmara e do Senado.

Para decidir quais projetos serão incentivados, haverá CNICs setoriais, com representação paritária do governo e da sociedade civil. O Fundo Nacional de Cultura também poderá receber dinheiro de doações, legados e subvenções, e esse dinheiro não seguirá o critério de partilha acima. Não será permitido o incentivo a obras, produtos, eventos circunscritos a coleções particulares ou circuitos privados que tenham limitações de acesso.


A União deverá enviar 30% dos recursos do FNC para fundos públicos de Estados, municípios e do Distrito Federal (com a observância de serem destinados no mínimo 10% para cada região do País, como forma de promover a descentralização do investimento). Mas, para receber o dinheiro, Estados e municípios deverão constituir órgãos colegiados e observar as regras da lei.


A renúncia fiscal continua existindo, mas também mudou. Os contribuintes (pessoas físicas ou jurídicas tributadas com base no lucro real) poderão deduzir 40%, 60% e 80% do imposto de renda devido quando financiarem um projeto cultural (valor limitado a 6% do imposto devido, quando se tratar de pessoa física, ou 4% do imposto devido, quando se tratar de pessoa jurídica). Um sistema de pontuação definirá em qual faixa (40%, 60% ou 80%) o incentivador se encaixa.


O recebimento dos projetos culturais será feito mediante editais de seleção pública, e a lei estipula um prazo de 30 dias para que sejam avaliados - um desafio extra para o governo, já que atualmente os atrasos são constantes por falta de pessoal técnico qualificado. Para a análise dos projetos, o governo prevê na lei contratar especialistas ou instituições.


Os projetos culturais com potencial de retorno comercial (filmes como os da Xuxa e dos Trapalhões, por exemplo, enquadram-se nessa categoria) poderão ser financiados em um sistema de parceria, que poderá tomar até 20% da dotação anual do FNC. Para tanto, serão direcionados para os Fundos de Investimento Cultural e Artístico (Ficarts). O Banco Central do Brasil será o gestor dessa parceria, e os lucros obtidos voltarão para realimentar o FNC.

Os institutos e fundações (ligadas a bancos ou grandes empresas) estão enquadrados na faixa dos 40%, e todos têm de colocar pelo menos 20% do próprio bolso (antes, a renúncia era de 100%).

Projetos da administração pública só poderão captar até 10%, para evitar concorrência com os mercados. É o caso, por exemplo, dos museus paulistas, que agora terão de reformular seus orçamentos - a Pinacoteca do Estado pediu, para 2009, R$ 13 milhões, e obteve autorização para captar R$ 12 milhões. Entretanto, os fundos públicos dos Estados e municípios poderão redirecionar seus recursos para essas instituições.

"Na medida em que existe um fundo que tem recursos que serão repassados aos governos, não faria sentido que o setor público captasse. Com um fundo novo, forte, que cumpre um papel importante, esta restrição nos parece natural", disse Alfredo Manevy, ministro interino da Cultura, ao site do Grupo de Institutos e Fundações (Gife). Segundo estimativa do governo, inicialmente o fundo vai ter cerca de R$ 800 milhões, a renúncia será de R$ 1 bilhão e o orçamento, excluída a renúncia, de R$ 2,2 bilhões (o maior da História, conforme antecipou o Estado no dia 15).

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